Criado para lutar pela reforma agrária em nome da sobrevivência da população marginalizada do campo, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) - que depois se transformou em uma organização clandestina voltada para a subversão da ordem democrática e a destruição do capitalismo - está preocupado hoje em sobreviver ele próprio. Seu maior desafio é o rápido esvaziamento de seus acampamentos em todo o País. Sem abandonar a tentativa de mobilização dos sem-terra e o uso dos acampamentos como instrumento de pressão para obrigar o governo a fazer novos assentamentos - um novo "abril vermelho" já foi anunciado -, a direção do movimento pretende mudar o foco prioritário de sua atuação, como deixou claro, em depoimento ao Estado (27/3), um dos membros da coordenação nacional, Gilmar Mauro: "A reforma agrária precisa de fato ser ressignificada (sic), com um debate político amplo que envolva toda a sociedade. Se continuarmos com essa lógica de exportação de commodities, com o uso intensivo de agrotóxicos, em menos de 50 anos teremos contaminado todos nossos rios, lagos, terra. É o que desejamos? Queremos consumir alimentos contaminados? Se a sociedade responder sim, então não há espaço para reforma. Se disser não, precisamos rever o modelo agrícola atual". O discurso é bonito. Mas quer dizer apenas o seguinte: já que entidades como o MST têm no confronto a razão de sua existência, e ninguém mais está preocupado com a falsa disputa entre a agricultura familiar e o agronegócio, o movimento decidiu se transformar em entidade ambientalista, com novo alvo específico bem definido: os agrotóxicos.
Há muito tempo o MST vem perdendo expressão, como mostram os números relativos à sua atuação. Em 2003, primeiro ano do governo Lula, o movimento era responsável por 285 acampamentos de sem-terra em todo o País, de acordo com a Comissão Pastoral da Terra. Em 2009 esse número havia sido reduzido para 36. E, no ano passado, continuou diminuindo. Segundo o Incra, as 400 mil pessoas acampadas em 2003 se tornaram menos de 100 mil em 2010.
As razões desse esvaziamento são óbvias. Talvez a mais importante seja o significativo aumento da quantidade de empregos, formais e informais, ocorrido nos últimos anos, especialmente na construção civil. Além disso, há o efeito que o Bolsa-Família provoca sobre a disposição para a luta de quem nada tem e por isso se conforma com o pouco que lhe oferece o assistencialismo paternalista.
Assim, o mesmo governo que estimulou as ações do MST - o presidente Lula não só recebia suas lideranças, como se deixava fotografar com o boné da entidade - e não coibiu os seus métodos violentos, ao proporcionar o crescimento da economia, foi também responsável pela desmobilização dos sem-terra. Além disso, o governo petista praticamente abandonou a reforma agrária, como relata o secretário da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra, Antonio Canuto (Estado, 27/03): "No início do mandato de Lula as pessoas acreditavam que ele faria a reforma e por isso foram para os acampamentos. Com o tempo percebeu-se que o empenho do governo não era tão forte como se havia prometido. Agora a situação é pior: a reforma não está no horizonte do novo governo".
Está claro, portanto, que o sentido e a importância da reforma agrária "ideológica" mudaram significativamente, até na cabeça de governantes que passaram a maior parte da vida com ela comprometidos. O que parece não mudar nunca é o discurso da liderança do MST, para quem tudo continua girando em torno da dicotomia socialismo/capitalismo. Presos a uma visão do capitalismo do século 19, não passa pela cabeça dos dirigentes do MST que uma sociedade democrática, livre e consciente, seja capaz de criar mecanismos e controles eficientes de produção e distribuição da riqueza. Preferem vender a ilusão de um socialismo que promete distribuir uma riqueza que não é capaz de criar, como está historicamente comprovado. Por mais que tente repaginar o discurso, o MST permanece inapelavelmente enredado no mais absoluto anacronismo.
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